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Ritos Iniciais - Parte 1

À minha avó Marianne Osterer André (imigrante austríaca) e meu avô Sebastião Lourenço André (caboclo mineiro – filho de mãe negra), que tiveram a ideia de ir para “Água Vermelha - Francisco Beltrão” em 1950, e passaram a morar nestas terras, obtendo destaque na plantação de frutas. 

Filho da T(t)erra

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à Guilherme.

 

Primeiro, nada é teu.

Nada é teu, pois a T(t)erra não é tua.

Não é nossa.

Ela é dela, e de mais ninguém.

Não caia no hábito de praga.

A dança da colina devastada,

Plantadeira no chão em (re)produção

Bem vindo filho, sou sua terra amada

Sudoeste em constante construção:

 

As dunas de trigo dourado,

Serpenteando as corredeiras elevadiças de terra,

Escavando túneis, alimentando o progresso,

Apaziguando a força dos rios e suas cheias.

O pássaro plainando na plantação. Elemento (Ar):

 

Dos sonhos perenes

Canteiro central da praça – Chafariz!?

E nada é teu...

Você não pode me enxergar

E eu não posso lhe ver.

A Terra está farta de dar,

Sem receber:

 

“ – Espero poder te visitar em Beltrão ainda!

Nossas conversas sempre foram produtivas,

Apesar de alguns impasses...”

 

Sempre será acolhido onde quer que eu esteja,

Qualquer lugar deste mundo...

Esta história não é tua, não é nossa.

É dela, e de mais ninguém.

 

“– Não precisa me esperar na rodoviária,

Eu vou estar perto da praça,

Me encontra lá na praça de Beltrão.”

 

Não caia no hábito de praga, poeta...

 

“– Estou na praça”

E eu na sua.

Nada é teu, pois a T(t)erra não é tua.

[As praças podem figurar um lugar de encontro. No dia 10 de outubro de 1957, por exemplo, cerca de 6.000 colonos concentraram-se na eventual Praça da Matriz, no ápice da Revolta dos Colonos ou Revolta dos Posseiros. No dia 03 de Agosto de 2018, por exemplo, entreguei uma borboleta bordada para o homem que amei, me dando pela segunda vez a vida – a primeira foi minha mãe (Miguelina de Fátima Soares da Silva). A Praça de Beltrão ou Eduardo Virmond Suplicy, com seu obelisco e traçado, foi construída e inaugurada em 1969, e revitalizada em 2017. Quantas histórias não nos escondem os bancos e as árvores, as pedras do chão, as luzes metálicas e o cimento?]

Vaca Profana

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"Inscrevo, assim, minhas palavras

Na voz de uma mulher sagrada

Vaca profana, põe teus cornos

Pra fora e acima da manada"

(Gal / Caetano)

 

Ouro verde. Habito fera.

Sertão maldito, miserável, coberto de copas pretas.

Não é tropeiro, nem pioneiro – analfabeta terra.

Caçador, ervateiro? Vaca profana tuas tetas:

Não é passagem, os porcos estão soltos.

A terra precisa ser trabalhada!

Eu contra tudo – lá vem a manada!

Elemento (Fogo):

 

Serrote de duas mãos, motosserra.

Estiveram onde nunca estive,

Sem pé nenhum de igualdade.

Derrubaram e gritaram: É GUERRA!

Ave Maria, em sua majestade:

Vê se me guia pra fora e acima

Desta praga que me subestima:

 

Qual é a identidade inicial, se não a minha?

Profana e selvagem – sagrada e sozinha.

GUAYRACÁ

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A minha causa não sou eu?

Epopeias sobre o amor e a (des)vida.

Monumentos autobiográficos?

Delírios em encenação de despedida.

Como vencer a dor do corpo, se o corpo não se supera?

Destruir em mim? Viver isso de forma severa,

Pois estou cansado de usar a tesoura tentando cortar

Partes do que sou para caber e se encaixar

Dentro das formas que não me servem. Deveria tentar,

E depois sentar para pensar e me dar,

O direito de ser o que sou. E sem questionar

Apenas ser: Guayracá: Então gritar:

“Co ivi oguereco yara!”

Em tom alto e com uma voz clara,

Porque meu corpo tem dono

Como também tinha esta terra.

Lobo das águas, solidão é desespero,

E meu corpo é solitário e guerreiro,

Fechado, resistente, comandando uma guerra.

Não se morre de verdade? É uma batalha!

Derrubar, abrindo chão, é um caminho.

Com o crispar bordando o céu: o azul da gralha,

Uma lagoa de lágrimas: estou sozinho!

Pea. Não é orgulho buscar o verso de ouro,

Aprisioná-lo, pois ele é livre e imponente.

Transformar meu corpo em um ancoradouro,

E vendê-lo como se não fosse gente.

Caaí. Água da folha. Fundo de rio.

Exploração não gera economia, gera genocídio.

Vindo com o gado, em Viamão surgiu

Pedaço do corpo que foi explorado. Suicídio:

Parecia certo não querer mais viver.

Convertido por armas? Convertido por deus?

Enfrentando batalhas. Vitória pros seus? Meus?

Nossos! Assim é que devo escrever?

Meu (E)estado datado de explorações,

Estou cansado de explorar para construir poesia.

Foi com o Caminho das Missões,

Que eu conquistei em literatura minha frenesia.

Espírito sem corpo, corredeiras sem água, fui cancheado.

Derrubaram-me para erguer sobre meu corpo a história.

Embrulharam o melhor dentro de um livro organizado,

Por sessões, contadas apenas na versão da vitória.

Ler é bom e triste.

Poesia que não existe:

Mesmo que todo dia seja poético.

Cor de Erva Mate,

No corpo indígena colocaste,

Um fim de tarde alegre e ético.

Talvez eu seja Erva,

Levada em um livro até alguém.

Eu sou refém do meu próprio corpo?

Começo a achar que até amor é problema hormonal.

Guayracá é uma lenda ou um herói, afinal?

E eu? Eu sou o quê? O que meu corpo representa?

E minha poesia?

Sozinha ela se sustenta,

Sem a minha anesia?

O que sou? Além de...

Escritor nascido, de um sertão desconhecido:

Um pinheiro do Paraná em desconstrução?

Seria a vida, a desvida ou a depressão?

Se minha causa não sou eu, apenas tento...

Revirar a terra, colocar escrita: eis o meu intento!

Resquícios da Revolta. Sedimentos Imigrantes:

Meu corpo imigrou pro papel.

Agora, quem é que morre?

[Seu corpo é sua história. Nele estão presentes as marcas das suas lutas – vitórias e fracassos. Pensar o corpo político é lembrar o porquê nasci aqui – Francisco Beltrão. É lembrar do grito da lenda/herói indígena Guayracá, que lutou bravamente contra os portugueses que procuravam riquezas além das costas. É lembrar do Caminho de Pea – Caminho do Ouro, que interligava várias nações e tribos. Dos primeiros, que por aqui podem não ter se estabelecido, mas passaram. É lembrar que meu corpo assim como o Estado do Paraná é feito e refeito por explorações e construções: o ouro, a madeira, a erva-mate. Lembrar do Caminho de Viamão, traçando rotas para o futuro território de Palmas, Pato Branco e Francisco Beltrão. A história também é seu corpo: hoje você é, para amanhã outro também passar a ser].

In Memorium

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Ontem, vivi o futuro

Hoje, acho-me antigo

Amanhã, estarei certo

(Della Torre)

 

Araut, gran. Capoduc, sinam:

Tempestade – vento forte – chuva de verão.

Nada foi tão forte, e me questiono:

Por que não valorizaram tudo aquilo que eu sou?

Raízes profundas, tiradas por máquinas.

Pessoas rasas, querendo a terra que me ergue.

Fui atorada – o vento humano me quebrou:

Dois Vizinhos – Pato Branco – Fco. Beltrão.

 

Caída, afastada do pássaro – sem pena.

As horas do dia não passam,

O dono da imagem: João-de-barro sem casa.

A sublimação do pássaro, consumido pelo azul do céu.

 

O farol está sendo erguido,

Pelas luzes imigrantes da terra.

Pela manhã o corpo consumido,

Não era o de Cristo – minha vida se encerra:

 

“Com a chuva, uma árvore caiu

No Parque de Exposições Jayme Canet Júnior

Quebrando o muro da rua Peru,

E bloqueando parcialmente a via.

Foi necessário a utilização de uma motosserra,

Para cortar os galhos e liberar a via,

Que já encontra-se normal para os veículos”.

 

Montanha – Colina, ave esperança.

Caravana de toras em dança,

Os passos reluzentes das margens do Rio Marrecas.

 

Tombar e morrer, e não ser eterno.

Não tratar a eternidade com eternidade.

Não tombar e morrer, decidido.

Saborear a despedida, o póstumo: a saudade.

Saudade de ser completa, na mata intocada.

Saudade de não araucária – não ser nada.

Apenas viva e de pé.

Completa?

Destruída em duas partes:

Faço? Sou? [Poetizado]

 

– Merda, parece viva mesmo. Que descanse em paz!

 

Tombar e morrer. Não ser eterno.

[Baseada na poesia “In Memoriam: Araucária” premiada com o 1º Lugar Tema Específico, no 11º Concurso Francisco Beltrão de Literatura de 2017 – A Identidade Rural na Urbanização do Sudoeste do Paraná – publicada em livro de mesmo nome].

[Epígrafe inicial do poeta Della Torre, do livro “Tudo... Num piscar de olhos” editado pela Fundação Cultural de Pato Branco, em 1992].

Sem Nome (Ato Penitencial)

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Eu conheço todas as minhas manchas,

As de caráter ou as de sol no corpo,

As de nascença ou os hematomas escuros,

As cicatrizes dos lugares que não eram seguros.

Eu peço perdão a minha terra, pátria mãe adorada,

Para o chão de onde nasci, Francisco Beltrão.

Dos fins de tarde com o horizonte em brasa dourada,

Do sudoeste do Paraná, o coração.

 

A cultura não passa a ser universal,

Porque é presa dentro de uma caixa quadrada,

Dentro de um espaço geográfico limitado,

Pelas fronteiras, pelas barreiras, pela desglobalização.

Arma contra arma. Opinião contra opinião.

Minha família não tem renome,

Na cidade onde vivo, sou apenas um Sem Nome.

 

Arte da mata em pé no quadro,

Carmes Franciosi*.

Tesão de terra, sua torre e seu sino,

Badalando sobre o calçadão central.

Em decreto de Getúlio Vargas,

Júlio Assis Cavalheiro, Luiz Antônio Faedo,

Construindo o seu grande enredo,

Arte da poesia deitada na horizontal:

 

Sem Nome.

Me viu crescer nas tuas ruas da década de noventa,

Tentando fazer o que muita gente tenta,

Eu peço perdão, Beltrão!

[Minha avó tinha um jornal antigo que noticiava a construção de pedras basálticas irregulares na rua onde moro, no bairro Cristo Rei. Para mim, que vi apenas anos mais tarde o asfalto, aquilo era o progresso – antigo no tempo, feito de história. Na infância, corri feito louco abrindo meus joelhos nas pedras. Desenhava com cacos de tijolos na rua. Criava cidades imaginárias em cada pedra, divididas por porções de terra e pequenos matinhos – que eram tirados periodicamente a base de enxadadas, pelas mulheres e homens que trabalhavam para a prefeitura. Sempre aparecia uma aranha que outra no começo do verão, perto do meio fio. Lá também, meu pai (Ari André) colocava fogo nas rugas junto com as folhas secas do pé de Butiá – que ainda se encontra firme e forte, vendo a cidade encolher cada vez mais seu tamanho].

*[A artista plástica Carmes Franciosi – residente desde 1960 na cidade, com obras expostas pelo Brasil e Exterior (Nova Iorque, Paris, Japão, Áustria, Bélgica, Itália, África do Sul, Argentina, Portugal, Cuba) – sempre foi uma inspiração].

Saturno Diamante

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Vermelho é o sol e rubi é seu morango.

A princípio é ativo. Ele é o rei Sol Diamante.

Jardim da terra das Órbitas de Saturno.

Saturno sou eu, e o sol é o centro.

Agora o homem se fixa de pé. Ele é Saturno Sol,

Jesus Sol de Diamante. Concatedral da Glória.

Sabedoria em hosana subindo aos céus.

Sua flor é laranja e a pedra laranjeira lua.

Baphomet é passivo, ele é terrestre,

Kalipso o Yin, reflexo do mar.

Todos os seres duplicados se alternam,

Buscam o feminino de Eva, e da imensidão.

Krishna – Saturno da justiça e força.

Tu podes chegar até a dúvida?

Amarelo é Vênus e Júpiter. E topázio é seu pêssego.

Cadê, os teus mistérios de terra Beltrão?

Largarei meu triângulo maçônico mágico,

Um homem filho da terra e do céu.

Cuidado com sua intuição,

Deixei as malas e plantei neste solo,

Uns partem, outros chegam e são. Eu sou.

Maria mãe do quadrado e da cruz,

Verticais como os pinheiros derrubados,

Dias e noites na terra da Estrela da Manhã,

Marrecas de Via Láctea,

Vive a construção e nela o homem.

Vou-me embora pra Pasárgada!

Homem que é homem ressurge,

Quando cai se transfigura.

Amarelo, azul – é céu B(b)andeira.

Dia/mante

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à Paulo.

 

– Como foi o seu dia? – perguntei.

 

“ – Olha, hoje o dia foi tenebroso.

Hoje foi: fuga de porco, fuga de vaca, daí

Uma novilha nova crio, aí

Tem que trazer ela pela primeira vez drento da estrebaria,

Ela não vem...

Puxava, ela deitava...

E fazia o regasso, e não entrava...

E agora que terminamo de tirar leite dela,

Soltamo ela e em vez dela ficar junto com as outras,

Ela me quebrou a cio de choque,

Foi lâ embaixo onde ela crio, atrás do bezerro,

Mas o bezerro já tá aqui em casa guardado,

Ahn, Senhor! Hoje o dia foi trurbulento!

E o seu como foi?”

 

 – Acabei um livro.

Liturgia da Palavra - Parte 2

E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade. João 1:14

PASSAPORTE

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Passando de boca em boca,

Cadê a força da sua geração?

Eu preciso de passaporte para entrar

Com minha poesia no Jornal de Beltrão?

E se derramar todo o empenho,

Dentro de uma farsa tão ingênua,

Apontando meu telescópio,

Para onde só tem escuridão?

A distância aumenta, o brilho se perde,

Poesia se mede?

Onde está o olho que pode ver tudo?

Poesia se mede fragmentada...

Fragmentos de tudo e também de nada...

Na mão do dono do muro, muro que fecha e não abre,

Sorriso que vai e não volta, sou um imigrante!

Meu poema imigrou para esta página,

Saiu da zona entre a incompreensão e o gênese.

Não sou nada fragmentado,

Sou um exagero:

De tamanho, de espera e de desespero.

E se andar tanto tempo nas sombras,

Com os olhos fechados, não querendo enxergar,

A catástrofe que separa todos os sistemas do meu corpo?

Dentro da epigênese dos leitores digitais,

Quem sabe agora estou fragmentado.

Dispondo o meu volume sobre a luz visível.

Cansei de ser o homem com senso de invisibilidade,

Porque meu corpo é sólido,

Minha poesia é incorporada,

Esta página é minha morada?

Eu preciso de passaporte?

Poesia é passaporte,

Poesia não é muro!

Poesia é visto de entrada,

Poesia é ponte!

E eu sou fragmentado,

Como o código das sociedades secretas.

Liberte de mim a sua construção, eu sou o que habito,

Porque a palavra em mim sofre, em mim ela é o grito!

Ela vem sobre meus dedos e não consigo entender,

Se isso é um passaporte, se alguém irá me prender!

Meu crime é ser aquilo que eu sou,

E aquilo que eu sou é tão pouco,

É gramática e poesia,

Interiorano em demasia,

Cadê a força da sua geração?

Porque a palavra é forte, em mim ela é luta!

De uma inspiração – terra em disputa!

Pelado tentando construir uma ponte.

Um carimbo no passaporte.

Passando de boca em boca,

Poesia se mede?

Poesia não é muro!

Eu acho que eu não estou seguro,

Meu poema imigrou para esta página,

Eu preciso de passaporte?

Vida Campestre (Salmo Responsorial)

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Quem é ela que anda lá longe?

Busca por serviços e coisas intermináveis.

Com os pés fixos no chão que a segura.

Ela sobe e desce montanhas,

Ela governa um rebanho.

Mas quem é ela?

Cinco minutos: no meio do “nada”.

Apenas uma vida campestre e você.

Os pássaros que sussurram ao longe,

Daquele imenso horizonte coberto,

Por uma selva vertical e verde.

O barulho de água do riacho,

Gota por gota batendo nas pedras.

Você podendo pensar sem contar o tempo.

Você e você – em fundamento.

Cinco minutos: no meio do “nada”.

Ela é aquela que planta e colhe frutos.

Aquela que ignora os vultos,

Brancos, neblina de uma manhã fria.

E quando acaba mais um dia,

A noite é sua religião,

É hora de descansar dos esforços,

Do dia da luta, dos córneos em ascensão.

Sua missão é fazer brotar vida,

Do fundo da Terra, plantada no chão.

Se de dia ela leva a boiada,

De noite descansa da emboscada,

Dos seres vultosos que brilham.

Ela é profana, ela é vaca.

A Vaca Profana, de Vida Campestre.

Para a Minha Lembrança

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Querida sobrinha, você verá o céu que eu vejo?

Você terá o prazer de ver o pôr do sol aqui de casa?

Você se sentará para observar o meu desejo?

Ver o horizonte consumir o sol como uma brasa?

Futuros filhos desta Terra, o que vocês estão vendo?

Futuros amantes da literatura, quais são os seus sonhos?

Vocês assim como eu sofreram e acabaram adoecendo,

Por suas escolhas ou pelos medos mais enfadonhos?

Qual dos garotos que eu fui, que você conheceu?

Eu agora sou apenas uma lembrança maluca?

O que de mim você teve? Por que você me esqueceu?

Eu fui o seu amigo ou a palavra que mais lhe machuca?

Você provou meu lado real? Você se entregou aos impulsos?

Você matou sua sede no calor, com uma limonada gelada?

Você tentou se matar e olhando para os seus pulsos,

Mas não conseguiu porque no fundo ainda se amava?

Coisa de gente maluca? Coisa de gente cansada!

Melhor escrever a lembrança da limonada gelada...

Querida sobrinha, você deve ter visto o que eu nunca vi,

Futuros filhos desta Terra, o que vocês estão vendo?

Os rumos da literatura que eu nunca conheci,

Podem agora estar abrindo meu livro e me conhecendo.

O que eu quero não tem mais importância,

Eu já fui presente e também já fui passado.

Quem sabe hoje eu seja apenas uma lembrança,

De alguém que viveu e já foi enterrado.

Conjuração da Madrugada

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Hoje se conjuram os verbos em pensamentos,

Hoje se revive uma vida de 27 anos.

As palavras hoje são iguais?

Significam a mesma coisa?

Conjuro três palavras santas,

Conjuro o tudo pelo nada,

O vivido pelo futuro,

O presente pelo paraíso.

Conjuro o céu com suas estrelas,

Escondidas sobre pesadas nuvens,

Que fazem de minha madrugada,

Um rio sonoro – sombrio. Elemento (Água):

 

Perante a Torre da Matriz – quadrado da janela,

Eu me ajoelho e acendo uma vela,

Eu conjuro sobre um terço,

Eu conjuro no escuro.

E sob a noite de Van Gogh,

Sob o sorriso de Monalisa,

Ou um dos tantos Franciosi,

Eu o conjuro meu grande medo.

Eu conjuro minha imagem,

Que encaro no espelho.

Eu conjuro as horas da noite,

Que regeneram o mundo por inteiro.

Eu conjuro o tezão de “T”erra.

Eu conjuro por fim a revolução,

E uma ideia do meu agrado,

Eu conjuro por fim a morte,

De tudo que sempre foi intocado.

[Na minha casa tem um porão, onde meu pai guarda suas ferramentas de trabalho, e onde na minha infância tinham um punhado de revistas da “Gente do Sul” – ele trazia, dos lugares onde trabalhava (pintor autônomo), quando resolviam se desafazer de algumas delas. Naquelas capas, conheci um punhado das Misses Beltrão, de vários anos – em especial a Maria Joana Parizotto, Miss Beltrão/ Paraná/ Brasil de 1996, ficando em 19º lugar no Miss Universo. Uma em especial de 1999 – eu ia na pré-escola, e ainda nem sabia escrever direito – também me chamou atenção: lá estava a Torre da Concatedral Nsa. da Glória, que marcou tanto meu imaginário que entrava nas minhas brincadeiras de construir cidades, nos canteiros de flor de minha mãe].

Tesão de terra (Evangelho)

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Aos homens e mulheres que amei.

 

Do que dela brota além da poesia?

Não alcança o céu o topo da curva do morro?

Em outros palcos, me preparei apenas para ti:

Semblante histórico em que construo e discorro:

 

Outras terras não eram maiúsculas!

Outras nem “T” tinham.

Me rasgavam com espadas,

Triturando o verbo com garras de aço.

Algo não está certo, é claro –

Ele foi e eu acabei ficando

Em busca da terra sagrada das palavras...

A busca pelo tesão de escrever.

A terra com um T maiúsculo de Terra.

A terra alquímica, elemento, solo fértil –

De onde erguem-se araucárias, prédios e histórias...

 

Os ventos da mudança sopraram

Nos cantos do assoalho encerado

E lustrado,

Ilustrução – Figurativo:

Tentava encontrar a escrita pela janela.

Eu fico vendo o sol nascer:

Eu posso ser um punhado desta terra toda –

Ordenado no papel com substantivos, adjetivos,

Verbos e pronomes.

Do que dela brota além da poesia?

Do que dela brota – “ninguém V”,

Estampada na capa da revista “Gente do Sul”.

Homilia

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Aqui, de onde eu moro, eu vejo o pôr do sol quase todos os dias. São coisas daqui. Coisas que eu sempre associo a aqui. O pôr do sol laranja, amarelo, vermelho sangue, um pôr do sol subtropical, de mata de Araucária.

No horizonte, curvado de montanhas, a cidade se perde. É interrompida por campos e matas que lá longe criam outras linhas sobre as linhas da terra. Parece uma mulher (Vaca Profana) cheia de curvas, terra fértil e muito adorada. Se eu olhar para trás não vejo nada. Apenas o fim de uma rua sem saída. Se olhar para os lados mais morros e um pequeno trecho da área central da cidade, coberta com vegetações cinzas, características dos grandes centros urbanos modernos, árvores de concreto, vidro e aço, com pastilhas, pinturas e elevadores metálicos.

Quando eu piso na floresta acinzentada, com suas calçadas de blocos de cimento, asfaltos e postes gigantescos, eu sempre penso: “sim, eu sou uma parte deste lugar”. Não fico sempre com isto na cabeça, outras vezes repenso e digo: “não, esse lugar não me representa!”. E no fundo da minha existência eu sei que sou todos os cantos, todos os bancos das praças, as árvores dos parques e os sorrisos das pessoas daqui. Não posso pensar como todos pensam, ou agir da maneira que todos agem, mais isso é normal, não sou manada.

Eu gosto de sair da biblioteca pública, na rua Ver. Romeu Lauro Werlang – com seus 25 mil livros – e saber que tem um café colonial na outra esquina, que me cobra oito reais para tomar um expresso e encher meu prato com salgados, enquanto tento ter ideias para o meu próximo e vindouro livro. Gosto de saber que tem missas na quarta feira, na igreja central, com formato de cruz, pintada de amarela ao lado da Torre da Matriz. E gosto mais ainda de saber, que no fim do ano terão fogos de artifício que explodirão no céu, sobre minha cabeça, vindos do Cristo Redentor – no Morro do Calvário – e iluminando minha rua, como se aquele fosse um espetáculo particular de agradecimento pelos dias do ano.

O lugar onde sempre se faz um pinhão na chapa, um quentão no inverno. Na minha casa não falta uma boa polenta com salame frito, com molho de frango, com leite frio. Fubá. Sopa de batatinha com farinha de trigo torrada, pelotas cozidas (uma espécie de massa com salame, uma delícia!), bolo de duas cores, cuca com carne assada. E batata é um alimento essencial para todos os dias da semana: no purê, fritas, na maionese de domingo, cozidas com sal...

Coração? Não bate uma vez só na vida, nem apenas na chegada ou na despedida. Tem coisas que ficam na pele, como a tatuagem do meu braço e a lembrança da terra, mesmo quando escritas com idéias pré-determinantes.

O paraíso subtropical de mata de araucária, não é privado. Rasga-se o corpo, elemento desnecessário. Dele se tem uma versão florida, em que não podemos esmiuçar os detalhes, e nem reduzir apenas dentro de uma grandeza física, biológica, matemática, poética, etc. As reformas são sempre niilistas. Estas palavras não as representam por completo!

[Conheci o trabalho de José Antônio Rezzardi (o “escrevinhador”) por acaso. Mais tarde fui descobrir sua naturalidade no munícipio de São João e toda sua vocação jornalística/ crônicas/ artigos. Literatura viva, Terra com T maiúsculo!].

[O histórico conflito entre jagunços e posseiros teve seu levante em 10 de Outubro de 1957, em um dos episódios mais marcantes da recém fundada cidade de Francisco Beltrão (1952). Sua relevância não apenas para a história local, mas nacional, se deve ao fato de ser um dos poucos casos onde o mais fraco (povo) ganhou a disputa pela terra. Não precisamos nos debruçar nos livros de história para ouvir ou saber das tantas crueldades praticadas pelos jagunços contra os posseiros – mulheres sofreram violências, casas foram queimadas, pessoas ameaçadas e mortas. A terra dos posseiros era um lugar de sustento familiar e não imobiliário. Este protagonismo do fim da década de 50 trouxe marcas não apenas na nossa identidade cultural, mas também econômica – do pequeno produtor rural. Entre 1962 a 1973, o governo federal realizou uma verdadeira reforma agrária no sudoeste, concedendo cerca de 43 mil títulos de propriedade numa área de 545 mil hectares de terras].

Revolta dos Posseiros

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Me diga o porquê está terra é tua?

Cadê o papel? Quem foi que lhe vendeu?

Sulista, católico, colonizador – o que cultua?

1957 – foi assim que tudo aconteceu?

 

Silêncio! Não diga! Isso quebra o discurso.

As zonas de sombra, adentrando a fogueira.

O rio da memória saindo do curso,

Extravasando a caixa, mesmo que ALGUÉM não queira.

A história social da terra – nem nova e nem braveira,

Subindo aos céus CURI-ANGUSTIFOLIA – cegueira:

 

Pelas ondas da Rádio Colméia – vem levante.

Ouvi o chamado do que me é determinado.

Tomei para si a luta, doravante!

Não é teu? Mas tome por emprestado!

Papéis nas ruas, gavetas jogadas – o que estão escondendo?

A terra está acordando, um novo dia está florescendo:

Não temo a força, a humilhação e violência

De facão na mão, espingarda na cinta – vou pra rua!

Eu quero minha terra, meu lugar e minha existência

Me diga o porquê está terra – TODA – é tua?

Nada é teu. Nada é nosso. Tudo é dela.

Abri os olhos e levantei bandeira.

O colono: o povo daqui ganhou.

De posseiro a proprietário –

Monumento em que trabalhou:

TERRA.

10 de outubro de 1957,

No lugar de NINGUÉM.

Céu Noturno

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às poetas Ilza Kozik, Julia Helena Rathier, Joise Maria Luft, Clenir Terezinha Corá, Joana Bertani, Patrícia Moresco, e a minha amiga e também poeta Milena Azeredo

 

Estrelas permanentes sobre o céu noturno,

Vagueiam entre as descobertas e florescências,

“A Nova Estrela” acordando na terra,

“A fogueira da menina que não tinha razão”.

Me invento “Atípica” como “A Marca”

Me transformo em “poesia Glitterizada”.

“Cataclismo” golpeia meus olhos:

“Silêncio”, “Culpa”, “Talvez” sim – talvez não.

 

Todos que são grandes estão mortos? Você acha?

Aqueles que ainda vão ser me parecem tão intocados.

Alguma coisa sempre parece que não se encaixa,

Quando olho para o céu com tantos pontos iluminados.

[as poetas – e não poetizas, por ser utilizado de forma pejorativa –supracitadas acima, mostram o poder da escrita das mulheres de nossa região. Todos os eventuais trabalhados me foram apresentados (Com exceção da escrita de minha amiga Milena) pela coletânea de autores do sudoeste do Paraná, organizada e publicada dentro do livro “Tudo em Versos” de 2018, em comemoração aos 20 anos do centro de Letras de Francisco Beltrão. Também me faço presente no livro com as obras “Nebulosa Camomila”, “Estar Só.lido” e “Refl.Ex.Ão” este último escrito por minha drag queen Amy C. Waves].

Liturgia Eucarística - Parte 3

Quem é esse Vinicius? Nasci e cresci em alguma parte da Terra. Talvez já tenha esbarrado com você na rua. Quem sabe estou sentado exatamente como você, espichando as pernas e esperando que este livro não seja igual ao punhado de outros livros que você ainda pretende ler, que precisa ler, ou que nem faça questão de folhear página por página. O que sou eu, além de um pinheiro-do-paraná em descontrução?

O Tronco Humano e Não Arbóreo

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Se eu sou um ser humano sem galhos, com meus braços,

Sem frutos, apenas com espermatozoides no meu saco,

Sem abrigo para pássaros, abrigando uma alma,

Meu tronco não deve possuir a mesma função.

Se desfragmentado não posso ser um palito de picolé,

Um móvel para a sala, um assoalho do chão.

O tronco humano, com alguns galhos,

Na parte de trás da minha nuca,

Uma tatuagem, o meu Kama Sutra,

Dos meus vinte e um anos, e espiritual.

 

Dentro desta complexidade de sistemas em ordem,

Minha caixa toráxica e meus membros superiores.

Teu membro direito é sustentado pelo emergente,

Teu membro esquerdo é muito mais gente,

Pelo clamor do povo que é eterno!

O tronco é humano e não arbóreo.

 

Então eu subi dos mares, como uma espécie extinta,

Tinha dez chifres e sete cabeças com tinta,

Porque sempre gostei de colorir os cabelos:

Dez coroas sobre meus chifres vermelhos.

Pai Nosso que estais no céu e no meu coração!

O tronco humano, com alguns galhos.

Pinheiro-do-Paraná em descontrução,

Respeito a outro tempo – de cabelos grisalhos.

Batata da Perna (Oferendas)

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Sopa de batata da perna, é o que tenho para oferecer,

Sem aposentadoria como eu irei me sustentar?

Não sou nem a metade do que pretendia ser,

E se eu procuro trabalho quem é que vai me dar?

Não tenho metade daquilo que sempre quis,

Não posso fazer tudo o que sempre sonhei,

E por quê? A voz ativa sempre me diz:

“Não adianta! Para sempre falharei...”

Eu tenho os meus santos, eu sou da reza mansa,

Da geração que não cansa,

Que planta os seus sonhos e retrabalha a terra.

 

Sou do tipo de ser humano que manda corações,

Mesmo estando com o meu em pedaços.

E o homem que coloca em todas as suas orações,

Os conhecidos, inimigos e seus fracassos.

Minha mente parece acessórios e roupas,

Eu escolho aquilo que me cai bem, obrigado.

Às vezes as justas e em outras as soltas,

As sóbrias também, para não parecer desregulado.

Já cansei de quantificar tijolos,

Precificar sentimentos,

Personificar emoções,

Desmascarar inverdades.

Sopa de batata da perna, é o que tenho para oferecer.

Rio Marrecas

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Desde criança, quando pensava

No piso do meu jardim cheio de cacos,

Imaginava a imagem inanimada de um rio não fixo,

Que começava em lugar algum

E acabava em um infinito desses qualquer,

Que valem mais do que as reticências

Ou o semblante da minha própria existência.

Mas, o rio espesso e escuro

Era apenas rejunte de argamassa entre cerâmicas

Que tinham sido quebradas aos cacos,

E colocadas de forma irregular dentro

De um espaço pré-determinado

Para não haver terra alguma.

Diferente do corpo do rio,

Que corta a cidade ao meio:

“Tomai, todos, e bebei: este é o cálice do meu sangue”.

[O Rio Marrecas, fonte de abastecimento de água potável da cidade, e que nasce no município de Flor da Serra do Sul, ao longo de sua história (como no ano de 1983) assusta com suas eventuais cheias. No fim de 2019 foram iniciadas obras de contenção prevendo a construção de um túnel, de uma barragem de rochas, do aprofundamento e alargamento do rio em sua extensão urbana – com a criação de um parque linear (projeto inédito em uma cidade interiorana)].

Mãe Nossa

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Mãe-Nossa, que estais na Terra

Santificados sejam teus cornos

Venha à nós, em nosso reino

Aquecendo os corações mornos.

Poeta de Paz

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Penso em dar-me um tiro na cabeça,

Morrer e não olhar para trás.

Quem sabe dessa forma tão grotesca,

A vida me transforme em um poeta de paz.

Drama

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O ser humano se reergue na tragédia,

Certo estavam os gregos por enaltecê-la,

Viver uma grande e bela comédia,

É o mesmo que viver a vida e não à tê-la.

Um Dia de Eclipse

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Boca em sangue, Mãe Terrena,

A sua imagem entra selvagem em cena.

Capítulo um da minha história:

Escrevendo sobre a memória.

Parágrafo, letra maiúscula:

 

Coração peludo, estrela da manhã,

A sua imagem é selvagem e vã.

 

Capítulo dois da minha história:

Escrevendo para Nossa Senhora,

Com as estrelas e os protegidos,

Os santos e os bandidos,

Que entrarão em minha vida.

 

Boca em sangue, vulcão em erupção,

Com a minha costela-de-adão,

Um pedaço da Terra Prometida, um dia de eclipse.

 

Capítulo três da minha memória:

Em uma caixa de vidro para a exposição – Barrabás!

Capítulo quatro e letra maiúscula:

Boca em sangue, cuspindo fogo,

Como um dragão que habita na lua.

Estrela marinha, rainha do mar,

Que me aparece brilhante e nua.

Parágrafo, letra maiúscula e travessão:

Capítulo cinco e ponto final,

Um dia de eclipse total.

A Ruína de Um Garoto

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Domingo ás vezes é frio dentro da alma.

Eu hoje resolvi ser a ruína e ter anos de história.

Meu coração é antigo como a terra em que eu piso,

E estou mais leve com o meu pensamento,

Menos apreensivo sobre o que pode dar errado.

Aprendi a me aceitar de cabelo enrolado e não liso,

Em ser magro e estranho sem precisar do julgamento,

E quem sabe o meu coração não seja assim tão gelado.

Eu sou o meu corpo deitado na grama se aquecendo,

E sou o meu corpo quando está sangrando e adoentado.

Sou a matéria bruta da via láctea desaparecendo,

Em ruínas dentro de um buraco mental imaginado:

E universal.

Quatro de Outubro

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[11º Concurso Francisco Beltrão de Literatura]

 

Não é sobre o recorde de prêmios recebidos,

Nem pela quantia em dinheiro.

Não é pela matéria do jornal,

Nem pelos parabéns recebidos.

Nem mesmo por passar uma quarta em êxtase,

Deitado no chão da cozinha

Com uma garrafa de vinho.

É sobre fazer com sentido, sem forma.

Escrever o que vier na cabeça.

Sobre a causalidade e consequência dos fatos.

Ritos Finais - Parte 4

A história no sudoeste começa por minha avó Marianne Osterer. Sua imigração começou em Julho de 1934, passando por Genova-Itália e chegando em Agosto no Brasil – SC. Em 1939, foi para São Paulo trabalhar, já que não aceitou o noivo escolhido pelos pais. Em Fevereiro de 1941, conheceu o jovem Tião, meu avô–mineiro de Guaxupé, que foi cedo com a família morar em São Paulo. Em 1942, o casal mudou-se para Santa Catarina – Treze Tilias, e não foram bem aceitos porque os parentes alemãos não gostavam de caboclos brasileiros misturando-se com a raça. Com o tempo, mudaram-se para a Linha do Cedro (município de Ibicaré – SC), onde ficaram agregados na terra do Sr. Ítallo Torres. Mudaram-se novamente para a Linha Caçador (município de Seara – SC), na terra de Egídio Lobison. Em 04 de Fevereiro de 1950 chegaram ao município de Francisco Beltrão. De minha avó (Olimpia da Silva) e avô (Olicius Soares) maternos, pouco se é relembrado. Apenas o deslocamento de Soledade – RS, para as terras do Verê – ainda nas décadas de 50 e 60, e posteriormente a mudança para a cidade de Ampére.

Corpo e Alma

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O velho tempo lá de fora, deságua sobre os telhados

Dos mais tradicionais aos mais destemperados,

E eu passando spray no cabelo, abotoando a camiseta.

E o canto?

Foi. E de mãos amarradas e dentes rangendo,

O canto acabou adoecendo

Deprimindo e querendo

Que a palavra diminuísse o volume!

Taca-lhe spray como de costume!

No canto, que não é inteiro por direito.

Foi dor com a porta do armário fechada,

Com as unhas amarelas e um dicionário de obrigados,

Para a remissão de todos os pecados,

E crucificado em um pé de cerejeira.

 

“Sabadiurnou” logo cedo,

Um sorriso de melão na xícara de sol.

Na barriga a cicatriz vermelha

Enchia-se de sangue roxo.

Estavam organizando um casamento na família –

Na Igreja de pedra, no Industrial.

Era o padrinho: de corpo e alma.

Francisco Beltrão

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- Sim, eu sou Francisco Beltrão!

Terra – arada, revirada, distribuída, retrabalhada.

Um solo remexido por um povo sonhador.

Francisco Beltrão com muito orgulho,

Francisco Beltrão com muito amor.

 

O sudoeste cheira a estrada de terra

E suor litúrgico –

Derrubem a araucária e abram caminho!

Peguem a espingarda e o facão:

- Sim, eu sou Francisco Beltrão!

Peguem a enxada e o maquinário:

Suba o Morro do Calvário,

A terra produz e também decompõe –

Como na “Alegoria de uma Jovem Beltrão”.

 

Entre um drama barato e vendido,

Passei a recalcular a minha fala.

Antes não retribuir um amor bandido,

Do que amar metendo uma bala.

Filho do Céu

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As veias da terra, dos ossos esquecidos

Veias amorfas, dos meus braços amolecidos

Estou em ampliação, acreditando estar esgotado.

 

Qual era o tempo entre tudo?

Não faz sentido. Então tornarei prosa:

Esta bela concepção racional saborosa

Meu amor está tocando o céu,

No topo do mirante, em cima da Torre.

De dia espreitando de noite espreitado:

Filho do céu – Manacá.

Para não ser mais um pobre coitado,

Tentando fugir de lá para cá.

 

Natureza poética,

Vaca Profana.

Deixei de olhar o chão e vi meu corpo:

Político-Construído-Vertical-Preservado.

Maiúsculo, poetizando – achado.

[FIM]

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